Denúncias contra João de Deus trazem à tona drama vividos por mineiras
As denúncias de abusos sexuais que teriam sido cometidos pelo médium João de Deus trouxeram à tona dramas vividos por mineiras que também se dizem violentadas pelo religioso. Ontem, duas mulheres procuraram o Ministério Público (MP) do Estado – elas ainda serão ouvidas. O número de vítimas, porém, pode ser maior, pois há quem não queira se expor para preservar a família.
Os supostos crimes não têm relação com as curas espirituais atribuídas ao homem, conforme ressalta a profissional liberal Roberta*, de 41 anos, que há quase três décadas convive com um segredo. “Ele me violentou”, afirma. Com a voz embargada, ela relembra o sofrimento confidenciado apenas à mãe e a uma cunhada. A mulher garante que, na década de 1990, a mãe foi curada de uma catarata por João de Deus. “O clima lá é muito bom, há muita fé”, conta.
Um ano depois do “milagre”, Roberta, então com 14 anos, seguiu com uma caravana da cidade onde morava, no Centro-Oeste de Minas, para Abadiânia (GO), onde o religioso atua. Lá, a então adolescente teria recebido um papel que a autorizava a ver o curandeiro após as sessões. “Eu me sentia toda importante por estar ali. Ao entrar, as pessoas oravam. Depois, todos saíram e ficamos só nós dois. Ele abaixou a calça e me pediu para fazer sexo oral nele. Eu, sem entender, fiz”.
Na volta para casa, a garota contou o episódio à mãe, mas nada foi feito. “Era um homem idolatrado”, relembra.
No aniversário de 15 anos, Roberta não quis festa e, novamente, seguiu para Abadiânia. Mais uma vez, foi convidada para estar com o religioso. “Ele abaixou a minha calça e a dele. Falou que eu poderia colocar o pênis dele onde quisesse. Fui salva porque alguém mexeu na porta. Ele se desesperou”, disse.
Ao ver o depoimento da coreógrafa holandesa Zahira Maus, que trabalhou com João de Deus e afirmou, na semana passada, ter sido estuprada pelo médium, o sentimento de Roberta foi de alívio.
Espanto
Quem também se espantou com as denúncias foi a organizadora de eventos Melyssa Diniz Vasconcelos Ferreira, de 38 anos. Ela foi ao encontro do médium em janeiro de 2015, após descobrir um tumor abdominal. Apesar de não ter sofrido nenhum abuso, a mulher relata que se sentiu intimidada logo no primeiro contato com o curandeiro.
“Eu estava junto com uma amiga em uma fila enorme em que as pessoas apenas pegavam na mão dele e saíam. Quando chegou minha vez, ele me parou, disse que eu era médium e deveria trabalhar com ele”.
Após o depoimento da holandesa, a organizadora de eventos foi enfática. “Até ouvir esse relato, eu ainda o defenderia, mas agora não. Me sinto realmente aliviada de não ter sido vítima”, afirma.
Força-tarefa
Após a explosão de denúncias, a Polícia Civil e o Ministério Público de Goiás criarão forças-tarefas especiais para investigar o caso.
O MP, inclusive, pretende atuar em conjunto com promotores de outros estados. As primeiras mulheres que fizeram denúncias devem começar a ser ouvidas nesta terça-feira (11). O órgão de Minas vai encaminhar os relatos recebidos.
Em nota divulgada no sábado, a Federação Espírita Brasileira afirma que o espiritismo orienta que o serviço espiritual não deva ocorrer isoladamente, apenas com a presença do médium e da pessoa assistida. A assessoria de João de Deus foi procurada, mas não retornou até o fechamento desta edição. À Rede Globo, que veiculou as primeiras denúncias, o advogado do médium negou as acusações.
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